Quando, num restaurante brasileiro, somos forçados a beber água mineral numa garrafa que mais parece uma amostra grátis ou miniatura, pagamos mais pela embalagem do que pela própria água. Esse tipo de abuso, de violência contra o consumidor por parte das grandes engarrafadoras de água mineral é, também, uma demonstração de irresponsabilidade ambiental corporativa. Isso é algo que jamais ocorreria num paÃÂs sério, onde o cliente sempre tem a opção de pedir água comum, filtrada, a preço zero.
Essa moda das grandes embalagens e pouco conteúdo, de alto custo monetário e ambiental, também está presente na indústria farmacêutica. Não é difÃÂci comprar alguns poucos comprimidos prensados entre uma folha de alumÃÂnio e outra de plástico numa caixa de cartolina bem maior do que o necessário. O que se deseja é ganhar destaque nas prateleiras ou dar ao consumidor a certeza de que ele é apenas um grande otário?
O jogo de cena da responsabilidade social e ambiental estende-se a muitas outras áreas, nem sempre tão evidentes para o observador “leigo”. Em alguns casos, trata-se “apenas” do desenho (design) da embalagem, mas na maioria das vezes essas questões envolvem a própria concepção do produto ou sistema. Desenho do produto quando, por exemplo, fabricantes de celulares produzem aparelhos descartáveis e sequer se interessam por padronizar as baterias ou os carregadores de baterias, forçando a aquisição de acessórios a preços elevados. Desenho dos sistemas quando, por exemplo, nem mesmo as refinarias da Petrobras, que consomem imensas quantidades de água, “fecham o circuito” e fazem o reuso (o que permitiria a redução do consumo de água de 90 a 95%). Há raros e escassos bons exemplos, mas no geral nem mesmo as multinacionais adotam, aqui, as mesmas práticas usuais em seus paÃÂses de origem. Há, também, exemplos de Irresponsabilidade pura e simples, como ocorre quando as prefeituras do Rio de Janeiro e de Curitiba permanecem omissas em relação ao aproveitamento do metano gerado nos aterros santiários de Gramacho e da Cachimba, respectivamente.
Ao final da década de 70, surgiu nos paÃÂses sérios um forte movimento que se convencionou denominar de “minimização de resÃÂduos”. Nos EUA, as grandes corporações tinham programas de “waste minimization” e procuravam demonstrar, inclusive com cifras, o quanto eram atuantes nessa área. Gradativamente, os órgãos governamentais de meio ambiente criaram estÃÂmulos para que outros atores sociais adotassem programas similares. A eficiência em matéria de redução da geração de resÃÂduos virou rotina nos paÃÂses sérios, mas os paÃÂses de economia periférica, como o Brasil, não souberam fazer o mesmo, com prejuÃÂzos ambientais e perdas de competitividade.
Aqui, temos, entre tantos, o problema da excessiva centralização da fomulação de polÃÂticas públicas e de regulentos, inclusive na área ambiental. Esse centralização “amarra” o paÃÂs, impede a diversidade de iniciativas, amordaça a criatividade. Lá, as cidades têm amplos poderes decisórios sobre assuntos de seu interesse especÃÂfico. Assim, na Alemanha, muitas cidades passaram a exigir que as lojas tivessem recipientes em locais visÃÂveis para que os clientes pudessem deixar as embalagens. Como a taxa de coleta de lixo domiciliar passara a ser incluÃÂda no preço dos sacos padronizados, os cidadãos não hesitavam em deixar nas lojas todas as embalagens inúteis. Não tardou nada para que as grandes produtoras de CDs de música deixassem de lado aquelas imensas e caras embalagens inúteis. Assim, reduziram-se os custos sociais da disposição final de resÃÂduos e o conjunto da indústria fonográfica tornou-se mais eficiente.
O mesmo tipo de abordagem foi tomado em relação aos veÃÂculos. Os fabricantes que quisessem vender na Alemanha passaram a ser obrigados a dar uma destinação aos carros ao final da vida útil. O que se objetivava era evitar que continuassem se ampliando os “cemitérios de automóveis”. A indústria estrilou, fingiu que isso seria impossÃÂvel, mas acabou mudando o design´dos veÃÂculos de maneira a reduzir a quantidade de materiais utilizados e a facilitar a sua desmontagem. Resultado: reparos mais rápidos e menos onerosos em casos de substituição de peças, maiores ÃÂndices de reciclagem, uma indústria mais eficiente e competitiva.
Eficiência não é exatamente uma caracterÃÂstica brasileira e isso se estende à gestão ambiental, pública ou privada. Alguns tentam se orgulhar, por exemplo, dos altos ÃÂndices de reciclagem de latinhas de alumÃÂnio que ocorrem no Brasil. Puro lero-lero. Esse desempenho resulta muito mais da abundância de pessoas extremamente pobres e desempregadas do que da conscientização da população ou de programas governamentais organizados. Esses programas – de governos municipais e de ONGs, em geral se limitaram à disponibilização de áreas para que os catadores de latinhas entregassem as latinhas recolhidas. No Brasil, quem ganha dinheiro de verdade nessa atividade são os atravessadores e a própria indústria de alumÃÂnio.
Fora isso, há iniciativas isoladas para o aproveitamento dos resÃÂduos de madeira gerados na poda de árvores em espaços públicos ou para a reutilização dos materiais de demolição. Mas quem se interessa por isso quando, do minstério à s secretarias municipais de meio ambiente, todos estão ocupadÃÂssimos com os grandes problemas nacionais, globais, e até “cósmicos”, sem que disso resultem polÃÂticas, planos e programas setoriais consistentes com “a tal da realidade”?