dá se foram, para Bali, um montão políticos que querem dar a impressão a seus eleitores de que estão fazendo o melhor para uma negociação global sobre as mudanças climáticas. Pobre Bali!
Desde muito antes, a imprensa internacional percebeu que lá não se tomaria qualquer decisão relevante, e não deu ao encontro nem mesmo uma pequena fração do espaço e das manchetes concedidos aos relatórios científicos do Painel Internacional de Mudanças Climáticas, conhecido por sua sigla em inglês, IPCC. O encontro de Bali deu chabu por antecipação.
Já se sabe que não está em questão apenas a emissão de carbono que causa as mudanças climáticas, mas todo o modelo de produção e consumo adotado pela assim autodenominada “civilização ocidental”, que já não se limita ao Ocidente. Nela, as pessoas se sentem mais satisfeitas por ganharem dinheiro e consumir do que por apender a tocar um instrumento, a pintar, ou a partilhar com amigos. Aqueles, sim, tornaram-se os valores sociais máximos e excludentes dos demais.
Há poucas semans, a Agência Internacional de Energia – www.ieg.org – alertou para o fato de que, mantidos esses padrões de produção e consumo, a demanda de energia crescerá em cerca de 30% até 2020, época em que a civilização do petróleo já estará bem próxima de seu fim.
Evidentemente, não se trata apenas de energia, mas de seu uso para transformar matérias-primas em bens de consumo. Mas como cada tema é tratado em separado, quanto mais se debate mais fica tudo igual. E o Brasil subsidiando a eletricidade utilizada na fabricação de latinhas de alumínio.
Em Bali, realiza-se um encontro de políticos e de diplomatas, duas categorias profissionais pouco ou nada confiáveis. Diplomacia é uma palavra que tem origem no grego antigo, com o significado de objeto duplo, papel dobrado em dois, e talvez aquele que vê com dois olhos, e que é pouco confiável. Só os franceses conseguiram dar a essa palavra um tom de elegância, mas os anglo-saxões ficaram com a expressão assuntos externos (foreign affairs). Diplomatas não decidem nada, apenas levam e trazem recados.
Quanto aos políticos, ninguém sequer imagina a possibilidade de que cogitem do envio de uma mensagem a seus eleitores propondo mudanças radicais no sistema de valores que caracteriza a sociedade de consumo.
O que já estava dito desde antes do primeiro encontro de cúpula sobre o desenvolvimento sustentável – em 1972! – é que esse modelo de desenvolvimento não é sustentável. O mundo não tem matérias-primas suficientes para que a Índia e a China alcancem os mesmos padrões de desenvolvimento – leia-se, de consumo – que os países altamente industrializados.
Parte da responsabilidade pelo fracasso antecipado do encontro de Bali se deve à noção formulada pelos economistas do Banco Mundial e consagrada pelo Protocolo de Quioto de que seria possível a adoção de mecanismos de mercado para resolver o problema das emissões de carbono. Pois bem, o Protocolo de Quioto fracassou, as emissões globais de carbono aumentaram e continuam a crescer, mas até mesmo ONGs como o Greenpeace – que já foi símbolo de alguma luta – ainda tentam acreditar nos tais mecanismos de mercado.
Por sua própria natureza, os mecanismos de mercado nunca se aplicaram aos assim denominados bens comuns. E não serão suficientes para que o preço do carbono que se deixa de emitir seja igual ao preço do carbono emitido, simplesmente por não terem o mesmo valor de mercado.
Os países sérios sabem disso e continuarão formulando e implementando políticas de segurança alimentar e energética local, regional. Enquanto Lula e seus pagadores de dívidas sociais continuarão a insistir na abertura desses mercados para os produtos primários brasileiros de baixo valor agregado – entre os quais se incluem, agora, os óleos vegetais com um novo codinome: biocombustíveis.
Terminada a farsa montada no cenário balinês, tudo voltará ao velho debate sobre crescimento econômico, ou seja, mais produção e mais consumo das mesmas coisas.
Há algum tempo, um filósofo de botequim fez um grafite na porta do banheiro de um bar da Califórnia: venda o lixo velho, compre lixo novo (sell old junk, buy new junk). Lá mesmo, recentemente, milhares de adolescentes fizeram filas durante dias para comprar seus novos iPhones.
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China e Índia, países com taxas de desenvolvimento elevadas, já disseram claramente que não aceitam a imposição de limites às suas emissões de gases causadores de mudanças climáticas, ainda que se comprometam com programas de eficiência energética. Já o Brasil, com suas baixíssimas taxas de crescimento econômico, continua na ladainha do “me dá um dinheiro aí”, mendigando uma bolsa-família planetária e, se possível, inter-galática, pirotécnica. Lula e outros representantes do governo insistem numa sobretaxa para o petróleo, mesmo quando não conseguem sequer fazer com que a CPMF seja utilizada para a gestão de um sistema de saúde pública minimamente decente. E celebram o lançamento da televisão digital capenga, anunciando o subsídio a conversores do sinal. É o PAC da vacuidade mental!
Todo mundo está enganando todo mundo. E aproveitando para se auto-enganar.
Muito bom artigo.
Luiz Prado Blog pra mim representa um dos poucos momentos de lucidez no debate socioambiental.
Mas uma vez atinge o cerne da questão.
O problema de produção e consumo que carrega consigo outros ambientais e sociais seríssimos é antes de mais nada cultural.
Quando olhamos por esse prisma vislumbramos o quão longe estamos de soluções práticas.
Louvemos a tecnologia e o capitalismo como alternativas e sejamos enganados até o fim próximo.
A população continua crescendo, e entendendo o sentido da felicidade de forma equivocada. Enquanto aqueles que se modificam e encaram o paradigma consumista são apenas os ecoxiitas.
Eu o sou, com propriedade!
Parabéns pelo artigo.
Mais uma vez uma pancada certeira no cerne da questão: modelo ocidental e agora também oriental (China já está chegando), de produção e consumo. Malthus deve estar se revirando na sepultura. Uma pérola o final do quinto parágrafo: O Brasil subsidiando a energia para fabricação de latinhas… Talvez devamos voltar ao conceito de “joule” para que possamos entender o balanco de energia necessário para produzir qualquer coisa em qualquer sistema político, econômico e social, desde plantar arroz até produzir “chips” micrométricos. Joule é a medida de energia despendida por uma força de um Newton para mover um objeto por um metro ao longo da direção da força. Com esse simples cálculo, pode-se calcular o balanço de energia para produzir qualquer coisa dentro de qualquer modelo de produção e consumo, visando ter-se claro o que realmente demanda negativamente os recursos ambientais já escassos. Nesse o Brasil já capotou. Não consigo resistir aos “ecochatos” e propor a eles um ligeiro estudo sobre a energia gasta para produzir bens denominados ecologicamente corretos e/ou alternativos. Parabéns!!!!!!!!!!!!!!!