As leis ambientais brasileiras – “que estão entre as mais avançadas do mundo†– podem ser divertidas. A questão é sempre: como se faz a lei? Um deputado troca o apoio à emenda proposta pelo outro pelo apoio à sua própria emenda, independente do conteúdo?
Assim, no caso de Arraial de Cabo, uma reserva extrativista – RESEX feita nas coxas, no litoral de uma área urbana -, terminou proibindo os pescadores de… pescar.
Promulgado em 1997, o decreto presidencial que criou a RESEX de Arraial do Cabo. O decreto delimitou a reserva por “coordenadas geográficas aproximadas†em tempos de GPS.  E o produto “reserva extrativista†saÃdo da ilha da fantasia situada em BrasÃlia funcionou sem que o mundo real sequer o percebesse a sua existência.
Mas em 2000 foi promulgada a lei que criou o Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC, que é essencialmente boa.  No entanto, emenda de cá, emenda de lá – o Art. 18, parágrafo 6o da lei, terminou proibindo a pesca nas reservas extrativistas
Alguém contrabandeou uma emenda pensando apenas em Xapuri?  Se essa determinação do texto legal for aplicada, os pescadores – profissionais ou amadores – só podem exercer as suas atividades a mais de 5,4 quilômetros da costa. Então, por falta de aplicabilidade, o assunto foi deixado de lado.
Com a palavra os juristas que acreditam que “o estado de direito†estrutura o mundo real. Ou melhor, com o silêncio.
***
Num dos estudos sobre o plano de manejo da RESEX considera-se a possibilidade de permitir a “pesca de canoa, a pesca de linha, a pesca de mergulho profissional, a pesca de mergulho amador, a pesca de cerco e a coleta de organismos para aquário†em diversas áreas da reserva. “Banana boat†e “jet ski†seriam permitidos em algumas áreas de uso, já que a RESEX inclui todas as praias do núcleo urbano de Arraial do Cabo. Só rindo dos ensaios de cafetinagem explÃcita do litoral de toda uma pequena cidade.
Já as técnicas de pesca que realmente aniquilam com os recursos marinhos – de arrasto, de espinhel, com redes de grandes dimensões - amplamente utilizadas ao largo de Arraial do Cabo por grandes embarcações, mas fora dos limites da RESEX, bem… essa não é coibida por ninguém.
***
O decreto presidencial foi assinado por Fernando Henrique Cardoso e pelo então ministro do meio ambiente, Sarney Filho (um luminar do PV). A prefeitura de Arraial do Cabo e o governo do estado do Rio de Janeiro sequer foram consultados.  Resultado do usual vÃrus “arrogantus Planaltensis“, praticamente impossÃvel de ser evitado pelos polÃticos e órgãos do governo em BrasÃlia.
– Quem escreveu esse artigo nunca deve ter pisado em Arraial do Cabo nem ter participado da criação desse tipo de unidade de conservação. Por sinal, esse tipo de UC tem sido elogiada em vários congressos internacionais como uma escelente iniciativa. Agora, se os órgãos ambientais não dão apoio para a continuidade do projeto inicial da RESEXMar de Arraial, só posso lamentar. E é isso que está acontecendo. Quanto a existência do Porto meu caro escritor, leia o plano de utilização dessa UC para se interar ou, se achar melhor, venha visitar a região e pesquisar a respeito. Assim, vc poderá falar com conhecimento de causa. Subscreve
José Eduardo – Biólogo e morador de Arraial do Cabo há 20 anos.
Conheço Arraial na palma da mão. Desde os tempos do almirante Paulo Moreira da Silva.
Mas a Resex não é o objeto do artigo, ainda que eu continue achando que ela só interessa a biólogos que forçar os outros a comprar suspeitos serviços amostragem de “organismos exóticos que possam ser encontrados no casco dos navios”.
Pode-se – e talvez deva-se – criar um Parque Nacional Marinho na área da ressurgência, mas o tema do artigo é outro, totalmente diferente.
O tema do artigo é a lei que cria o Sistema Nacional de Unidades de Consevação – SNUC que proÃbe a pesca no interior desse tipo de UC. E, se respeitado o ordenamento jurÃdico, nem o decreto de criação da RESEXE e nem o plano diretor podem se sobrepor à lie, e este teria que se adaptar à ela.
Claro que esse é um dispositivo otário da lei, e a ironia embutida no artigo foi justamente relacionada a como se fazem leis ambientais no Brasil. E como se fazem UCs, também. Com “coordenadas aproximadas” mesmo em tempos de GPS.