O anúncio da aplicação de multa no valor de R$ 250 milhões à “São Marcos” – Samarco, em dilmês – foi apenas uma jogada de marketing político?
Só os tributaristas e os tribunais dirão, se a empresa optar por recorrer.
Isso porque em o valor máximo das multas por danos ambientais encontra-se limitado a R$ 50 milhões nos termos da Lei 9.605/88, depois regulamentada pelo Decreto 6.514/2008 e outros.
De fato, de acordo com o Ibama teriam sido 5 multas de igual valor, por 5 razões diferentes, conforme listadas no Artigo 62 do mesmo Decreto. Mas como o fato gerador da multa foi o mesmo – e de fato a atordoante irresponsabilidade da Samarco (leia-se Vale e BHP Billinton) resultou em vários danos contidos nessa lista – a multa poderia ultrapassar o valor máximo previsto no artigo anterior.
Tendo o fato gerador sido o mesmo, não é improvável que o questionamento logo surja, no campo dos recursos administrativos ou judiciais. Até porque, a contaminação ainda não chegou ao mar e persistirá por décadas – e os responsáveis não vão sequer querer se arriscar a novas multas pelo mesmo fato gerador.
O Parágrafo Único do mesmo artigo determina que ” as multas e demais penalidades de que trata o caput serão aplicadas após laudo técnico elaborado pelo órgão ambiental competente, identificando a dimensão do dano decorrente da infração e em conformidade com a gradação do impacto”.
Não houve divulgação – ao menos pela grande imprensa – do laudo técnico elaborado pelo “órgão ambiental competente”.
A leitura do Decreto – que pode ser feita clicando na área sublinhada – mostra o grau de improvisação adotada na sua redação, tantas foram as partes suprimidas ou cuja redação foi alterada por outros decretos, já em 2008 e em 2010.
Nos muitos artigos anteriores, que tratam de outros assuntos como supressão de vegetação nativa, faz-se referência a multas diárias. Neste, e só aí, na “Subseção III – Das Infrações Relativas à Poluição e outras Infrações Ambientais”, essas questões são tratadas. Foram necessários 61 artigos para lá chegar. E nada de multa diária.
Ao contrário, encontra-se no Inciso X do Artigo 62 utilizado para aplicação de multas por diversos tipos de danos, sem ressalvas ao valor máximo previsto no artigo anterior, há uma curiosa isenção específica para a disposição de resíduos da mineração.
X – lançar resíduos sólidos ou rejeitos in natura a céu aberto, excetuados os resíduos de mineração; (Incluído pelo Decreto nº 7.404, de 2010).
Interessante o cuidado com o detalhe, alteração introduzida dois anos depois da promulgação do decreto em pauta, e o interesse em preservar as mineradoras de responsabilidade quando elas “criam corpos hídricos”, ainda mais se considerarmos que o mesmo princípio não se aplica a outros corpos d’água, “naturais ou artificiais”.
Será que houve algum lobby?
De toda forma, se a intenção era de punir com o maior rigor da lei – que é branda para casos como esses – seria melhor acrescer à multa máxima uma representação do MPF pedindo a condenação criminal, conforme prevista no texto abaixo transcrito.
Seção III
Da Poluição e outros Crimes Ambientais
Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora:
Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.
1º Se o crime é culposo:
Pena – detenção, de seis meses a um ano, e multa.
2º Se o crime:
I – tornar uma área, urbana ou rural, imprópria para a ocupação humana;
II – causar poluição atmosférica que provoque a retirada, ainda que momentânea, dos habitantes das áreas afetadas, ou que cause danos diretos à saúde da população;
III – causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade;
IV – dificultar ou impedir o uso público das praias;
V – ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos:
Pena – reclusão, de um a cinco anos.
§ 3º Incorre nas mesmas penas previstas no parágrafo anterior quem deixar de adotar, quando assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível.
A lei em questão é débil para um crime dessa magnitude. Mas se a intenção era a punição máxima possível, a representação por crime ambiental ainda pode ser feita.